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Reações alérgicas pós-vacinais: considerações sobre a patogenia e o quadro clínico

Entre as reações pós-vacinais com base imunológica, encontram-se as chamadas reações de hipersensibilidade. Os tipos de reações de hipersensibilidade se dividem em quatro: tipo I – imediata ou alérgica, tipo II – citotoxicidade dependente de anticorpos, tipo III – mediada por imunocomplexos e IV – tardia ou mediada por células. Apesar de a taxa de reações vacinais atualmente ser considerada muito baixa na população de cães e gatos em geral, as reações de hipersensibilidade do tipo I ou alérgicas são as mais comuns no atendimento veterinário de animais de companhia.

Patogenia

A patogenia das reações alérgicas envolve obrigatoriamente a participação de mastócitos, células originárias da medula óssea que maturam nos tecidos e são encontradas nos tecidos subepiteliais e ao longo dos vasos sanguíneos. Para que ocorra uma reação alérgica, é necessário ter acontecido uma exposição prévia do organismo a um determinado alérgeno, em geral proteínas e, menos comumente, carboidratos.

Sendo assim, as reações alérgicas vacinais tendem a ocorrer com frequência maior em animais que já receberam vacinas em algum momento da vida. Um estudo bastante abrangente em cães mostrou que o risco de reações vacinais em geral (incluindo as alérgicas) foi 35 a 64% maior em animais entre 1 e 3 anos que entre 2 a 9 meses, havendo declínio a partir dos 3 anos. Esse resultado sugere que pode haver a necessidade de exposição aos alérgenos vacinais durante a primo-vacinação para que a reação desenvolva-se logo a seguir na idade adulta.

Vários componentes das vacinas podem servir como alérgenos e não apenas os microrganismos em si. Após exposição primária a um antígeno, ocorre uma resposta do tipo Th2, com subsequente produção de citocinas que estimulam os linfócitos B a diferenciarem-se em plasmócitos e a secretar imunoglobulinas do tipo E (IgE). Essas moléculas ligam-se então a receptores de mastócitos, tornando-os sensibilizados para aquele antígeno. Em uma nova exposição, os antígenos podem provocar a ligação cruzada de moléculas de IgE na membrana dos mastócitos, levando à sua ativação e à liberação de uma série de mediadores responsáveis pelos sintomas.

O primeiro evento de ativação dos mastócitos é a liberação de mediadores pré-formados contidos nos grânulos citoplasmáticos. Histamina, heparina, proteases e quemotectantes são algumas das substâncias prontamente liberadas na circulação em segundos após a ativação. O prurido, a vasodilatação, o aumento de permeabilidade vascular e a broncoconstrição são efeitos diretos da histamina.

A seguir, cerca de minutos após a ativação, observa-se a formação de eicosanoides, como prostaglandinas, prostaciclinas, tromboxanos e leucotrienos, provenientes da ação da fosfolipase A2 sobre os fosfolipídeos de membrana dos mastócitos. Em conjunto, os eicosanoides promovem a inflamação, contribuindo para aumentar a permeabilidade vascular e a quimiotaxia de eosinófilos e basófilos. O evento mais demorado é a liberação de citocinas (IL-3, IL-4, IL-5, IL-13), produzidas algumas horas depois para reforçar a resposta Th2 e ativar eosinófilos. Tais células também contribuem para os sintomas da fase tardia das reações alérgicas (Figura 1).

Figura 1 – O mastócito ativado nas reações alérgicas. Após a ligação cruzada entre o antígeno (Ag) e as moléculas de imunoglobulina do tipo E (IgE), mediadores pré-formados são liberados em segundos. Eicosanoides, como prostaglandinas (PG), tromboxanos (TX), prostaciclinas (PGI) e leucotrienos (LT) são sintetizados a partir do ácido araquidônico (AA) proveniente dos fosfolipídeos de membrana minutos depois. Por fim, em algumas horas, citocinas são produzidas e liberadas pelos mastócitos.

Figura 1 – O mastócito ativado nas reações alérgicas. Após a ligação cruzada entre o antígeno (Ag) e as moléculas de imunoglobulina do tipo E (IgE), mediadores pré-formados são liberados em segundos. Eicosanoides, como prostaglandinas (PG), tromboxanos (TX), prostaciclinas (PGI) e leucotrienos (LT) são sintetizados a partir do ácido araquidônico (AA) proveniente dos fosfolipídeos de membrana minutos depois. Por fim, em algumas horas, citocinas são produzidas e liberadas pelos mastócitos.

Quadro clínico

Dois tipos principais de hipersensibilidade do tipo I podem ser identificados. Um deles é o choque anafilático, caracterizado por liberação massiva e imediata de mediadores pré-formados segundos a minutos após a vacina, resultando em profunda hipotensão e broncoconstrição. Vômitos, diarreia, dispneia (por edema pulmonar) e cianose podem ser observados inicialmente, evoluindo para decúbito e óbito. Alguns animais, todavia, podem morrer imediatamente após a aplicação.

Outra forma de hipersensibilidade, muito mais comum que o choque anafilático, possui um caráter mais brando, raramente com consequências fatais, e ocorre em geral no máximo em 24 horas após a aplicação. Os cães podem apresentar angioedema, edema de face, pápulas, prurido, vômitos e diarreia. Os gatos, por outro lado, dificilmente apresentam angioedema, prurido e edema de face. Muitos deles terão vômitos, diarreia e alterações de comportamento, como tentativas de se esconder logo após a aplicação da vacina. Dispneia e cianose são vistas nos casos mais graves. Pode-se dizer que todo choque anafilático é uma reação de hipersensibilidade do tipo 1, mas nem toda reação de hipersensibilidade do tipo 1 é um choque anafilático.

É muito importante atentar para as diferenças de sintomatologia entre cães e gatos com reações pós-vacinais. Aparentemente, cães são mais predispostos a reações alérgicas, ao passo que os gatos tendem a desenvolver reações mais sistêmicas (caracterizadas por febre, anorexia e apatia) e no ponto de aplicação.

O diagnóstico das reações de hipersensibilidade do tipo 1 é baseado no quadro clínico, havendo relação temporal com a aplicação de vacinas nas últimas 24 horas. Animais com histórico de reações vacinais alérgicas prévias devem merecer atenção especial. Como alguns sintomas como vômitos e diarreia podem ser inespecíficos e compartilhados entre as reações anafiláticas brandas e o choque anafilático, é prudente a intervenção medicamentosa precoce e o acompanhamento dos animais em âmbito hospitalar por algumas horas antes da liberação para casa.


Embora raras, as reações alérgicas pós-vacinais podem ocorrer. Conhecer a patogenia e o seu quadro clínico contribuem para o tratamento adequado e a minimização de complicações.

Atenção: O conteúdo deste site é destinado exclusivamente a médicos-veterinários, profissionais qualificados para avaliar e atestar a saúde de cães e gatos durante o processo de imunização. Se você não é um médico-veterinário, procure as informações com o profissional de sua confiança.
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