Gatos, Imunização

Locais de aplicação de vacinas em felinos: há certo e errado?

Homem segurando gato

Uma dúvida recorrente entre os veterinários é: onde devo aplicar a vacina (ou até mesmo medicamentos) nos meus pacientes felinos? O que é o correto?

Essa é uma questão pertinente, visto que o programa vacinal é feito anualmente, durante todos os anos da vida do animal, e também devido à predisposição de alguns deles desenvolverem sarcomas no ponto de aplicação.

Os sarcomas no ponto de aplicação, também chamados amplamente na literatura de Feline Injection Site Sarcoma (FISS), são neoplasias malignas advindas de uma inflamação (um estímulo, irritação do tecido) após a aplicação subcutânea de diversos medicamentos, desde antimicrobianos, anti-inflamatórios e até mesmo vacinas. Há relatos na literatura de que até mesmo microchips e fios de sutura possam levar ao desenvolvimento do sarcoma em felinos. Estes sarcomas metastizam apenas em alguns casos (<20%), mas são altamente infiltrativos, o que leva a frequentes recidivas após excisão cirúrgica do tumor (até 69%), ainda que se proceda com margens cirúrgicas amplas (5 cm laterais e 2 planos musculares abaixo).

Esse cenário leva à válida discussão sobre quais seriam os locais ideais para aplicação de medicamentos e vacinas nos felinos, a fim de minimizar riscos de surgimento do tumor e, caso esse se desenvolva, que esse local ofereça maiores margens para excisão cirúrgica com segurança, visando minimizar a chance de recidivas. Existem 4 guias de vacinação para felinos atuais, com suas recomendações e particularidades, que discutiremos a seguir: American Association of Feline Practicioners (AAFP), World Small Animal Veterinary Association (WSAVA), European Advisory Board on Cat Diseases (ABCD) e um guia voltado especificamente para o Brasil, publicado pelo Comité Latino Americano de Vacunología em Animales de Compañia (COLAVAC/FIAVAC).
1. AAFP e COLAVAC
No guia publicado em 2013, a AAFP recomenda que as vacinas sejam aplicadas nos membros torácicos e pélvicos, em sua face lateral e o mais distal possível; assim, caso o animal desenvolva o sarcoma, a amputação do membro afetado com margem segura é possível. Essa recomendação foi seguida pelo COLAVAC. (Figura 1) Ainda, o ideal é que sejam mantidos os mesmos membros para aplicação de uma determinada vacina durante toda a vida do animal: vacinas contra panleucopenia, rinotraqueíte e calicivirose (tríplice) devem ser aplicadas sempre abaixo do cotovelo direito – podemos estender o mesmo para quádrupla; vacinas contra a leucemia (ou vacinas conjugadas com esse antígeno, as quíntuplas) devem ser realizadas abaixo de joelho esquerdo (Leukemia-Left), ficando a vacina antirrábica com local de predileção sendo abaixo do joelho direito (Rabies-Right). Ainda, existem duas recomendações importantes: não fazer vacinas por via intramuscular, já que, caso o sarcoma se desenvolva, não será possível a visualização do aumento de volume de forma precoce; e evitar a região interescapular dorsal, que não oferece margem cirúrgica adequada caso necessária a excisão do tumor.

• Panleucopenia, calicivirose e herpesvirose (tipo 1) - abaixo do cotovelo direito

• Raiva (Rabies - Right) - abaixo do joelho direito

• Leucemia viral (Leukemia - Left) - abaixo do joelho esquerdo

Figura 1 – Orientação sobre locais de aplicação de vacinas conforme a American Association of Veterinary Practicioners (AAFP) em 2013


2. WSAVA
Na publicação de 2010, o guia da WSAVA recomendava que as vacinas fossem aplicadas nas faces laterais do abdômen, evitando as regiões de tórax e interescapular, visto que são áreas com menor margem cirúrgica quando comparadas às laterais do abdômen. Na atualização de 2016, continua a contraindicação da região interescapular, mas não há sugestão de área preferencial, recomendando-se apenas que a vacinação deve ser realizada em área de fácil acesso que permita a remoção cirúrgica em caso de neoplasia. (Figura 2) Duas outras observações importantes foram mantidas na atualização de 2016: evitar as aplicações intramusculares (a via subcutânea é a de eleição), e os locais de aplicação das vacinas devem ser rotacionados ano a ano, anotando-se na carteirinha da vacinação qual lado e local foi escolhido em cada ocasião, ou seja: se em um ano eu apliquei a vacina antirrábica na face lateral esquerda do abdômen, no ano seguinte devo aplicar essa mesma vacina na face lateral direita do abdômen; o mesmo deve ser feito com outras vacinas.
vacina_gatos

• Não se deve aplicar vacinas na região interescapular

Figura 2 – Orientação sobre locais de aplicação de vacinas conforme a World Small Animal Veterinary Association (WSAVA) em 2016
3. ABCD
O guia da ABCD indica apenas que os animais devem ser vacinados em locais que favoreçam uma cirurgia de excisão da neoplasia caso necessário (seja amputação de membro ou retirada de pele abdominal lateral)

E a aplicação de vacinas na cauda?

Um estudo recente avaliou a possibilidade de vacinar os felinos na cauda, para ter uma outra opção de local de aplicação que permitisse a amputação do local afetado por um possível sarcoma. A vacina foi realizada no terço distal dorsal da cauda, e de forma geral, foi considerado seguro e aceitável quanto ao conforto na aplicação. Estes animais foram avaliados de 1 a 2 meses após o procedimento, e houve soroconversão da maioria dos animais, tanto para vacina antirrábica (29/30) quanto para panleucopenia (14/14). Apesar desses resultados encorajadores, é importante lembrar que as vacinas são testadas utilizando áreas de aplicação regulares, ou seja, não há evidência científica suficiente para garantir que a proteção conferida por esse novo local de aplicação seja a mesma, principalmente quando pensamos em extrapolar os resultados para toda uma população.

Quando comparamos as orientações dos guias, observamos que há pontos comuns e pontos divergentes entre eles:

  • Em comum, podemos ressaltar a recomendação de aplicação subcutânea (e não a intramuscular), o registro do local/lado de aplicação e a indicação de evitar a região interescapular.
  • Em divergência, temos os locais de predileção para aplicação das vacinas, que podem ser na parte distal dos membros ou ainda na lateral do abdômen. Importante salientar que a aplicação em membros exige um pouco de prática, visto que não é um local usualmente utilizado no atendimento e medicalização desses pacientes. Há necessidade de uma conversa franca com o tutor, que também não está habituado com o local, e ele deve entender a motivação e os prós e contras da aplicação.

Como conclusão, podemos observar que existem duas orientações para aplicação de vacinas em felinos: face lateral dos membros e faces laterais do abdômen; com relação à cauda, não há dados suficientes na literatura para embasar sua utilização.

*Atenção: O conteúdo deste site é destinado exclusivamente a médicos-veterinários, profissionais qualificados para avaliar e atestar a saúde de cães e gatos durante o processo de imunização. Se você não é um médico-veterinário, procure as informações com o profissional de sua confiança. Confira o estudo completo e as referências bibliográficas no link, clique aqui.

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